O homem que tentou matar Batman


HISTÓRIA MALUCA

Fredric Wertham moveu uma cruzada contra os quadrinhos - e venceu!
Responda rápido: quem é o maior inimigo do Batman? Se você foi óbvio e falou Coringa, passou longe. Porque, por mais que o palhaço assassino possa levar o Cavaleiro das Trevas às raias da loucura, só um homem pôde deixá-lo inofensivo, transformando-o num crianção por quase duas décadas. O psiquiatra Fredric Wertham.

Desde o final dos anos 1990, personagens dos quadrinhos se tornaram a galinha dos ovos de ouro de Hollywood. Sem falar nas megaproduções, Deadpool, ano passado, foi um dos filmes mais rentáveis da história: com um módico orçamento de US$ 50 milhões, fez US$ 783.

É difícil imaginar que, há 70 anos, uma gigantesca campanha de difamação quase tenha destruído a indústria americana dos quadrinhos. O mais surpreendente é que ela foi toda criação de um único homem, então um obscuro psiquiatra do sistema judiciário de Nova York.

Os gibis surgiram em 1935, embora as tiras já fossem publicadas em jornais desde 1896. Wertham, nascido na Alemanha em 1895, criou uma histeria inédita contra eles. Na edição de 29 de maio de 1947 do semanário Saturday Review of Literature, escreveu um artigo explosivo acusando-os de serem “violentos e carregados de perversões sexuais”. Seu argumento: 90% dos menores delinquentes em Nova York liam quadrinhos; logo, eles eram responsáveis pela criminalidade. O artigo teve o efeito devastador da kriptonita sobre o Super-Homem.


Em 1948, Wertham lotou um ginásio com a palestra A Psicopatologia das Histórias em Quadrinhos. No fim do ano, a revista Time noticiava uma queima de revistinhas em algumas cidades. Os alvos prediletos do psiquiatra eram Super-Homem, Mulher Maravilha e Batman. Wertham, aliás, foi o primeiro a falar que o homem-morcego era gay. E motivou a criação do mordomo Alfred – para colocar ordem na casa de Bruce Wayne.

Em 1954, o psiquiatra escreveu sua obra mais conhecida, A Sedução dos Inocentes. Mais uma paulada nos quadrinhos. Dessa vez, chamou a atenção até do Congresso americano, que pressionou as editoras a criarem um código de ética, o Comics Code Act. De sua adoção até abolição, os quadrinhos ficaram meio... ridículos. O código obrigava a tratar qualquer quadrinho como um produto para crianças e, diante de tal censura, personagens como o próprio Batman perderam todo seu impacto. Essa foi a Era de Prata dos quadrinhos, desprezada por muitos, mas também recordada com nostalgia, por sua insanidade cafona. O hilário Batman da TV, de 1966, é um fruto dessa época.

O Código caiu em desuso só em 1971, por causa da pressão corajosa de Stan Lee –  ele mesmo.

Wertham, contudo, não se importou nem um pouco com isso. Em 1973, deixou todos estupefatos declarando-se fã da arte pop que antes demonizara. Chegou a escrever um livro com elogios aos gibis, O Mundo dos Fanzines: Uma Forma Especial de Comunicação, de 1974.

Quando morreu, em 1981, Wertham tinha se tornado leitor, mesmo que esporádico, de Batman e Homem-Aranha. Se fosse nos quadrinhos, pode ter certeza: três edições depois, ele se tornaria mau novamente.